Denise C. Studart [1]
Introdução
Desde meados de março de 2020, a vida de todos os brasileiros mudou radicalmente. A pandemia de Covid-19 é uma realidade que ninguém podia imaginar, diferente de tudo que já experimentamos. Passamos a ser bombardeados por informações, orientações e novas regras de comportamento. Tivemos que mudar rapidamente nossos hábitos e,em poucas semanas,nos adaptar a novas formas de trabalho, de lazer e de viver as relações afetivas.
Com a imposição do isolamento/distanciamento social, a comunicação virtual – que já existia e já era bastante utilizada por uma grande parte da população – tomou um novo significado e um lugar central na vida de todos. As mídias sociais, as plataformas de conversa por vídeo, as notícias online, as palestras e cursos pela internet, a interação com “lives” diversas, passaram a ser os principais meios de comunicação e de conexão humanas.
Nesse contexto, diante da crise que assola o mundo com a pandemia do novo coronavírus, trazemos aqui algumas reflexões para a situação dos museus.
Museus em tempos de pandemia
De um dia para o outro, os museus se viram obrigados a fechar as suas portas, colocar suas equipes em trabalho remoto ou em rodízio devidamente protegidas.
No Brasil, muitos museus são públicos e recebem uma verba anual do Governo para a sua manutenção e realização de atividades básicas. Mas para aquelas instituições que dependem da venda de ingressos para a sua sustentabilidade financeira, fechar as portas aos visitantes criou um cenário preocupante, que requer novas estratégias de captação para enfrentar esse momento.
Funcionários dos museus estão sendo incentivados a trabalhar de casa para que os projetos possam continuar em andamento. A realização de reuniões online de equipe já é uma realidade para muitos. Isso é particularmente viável para alguns tipos de tarefas–planejamento, pesquisa, programação visual, entre outros. Já para aquelas funções que se ocupam do atendimento presencial, o trabalho durante esse período de pandemia precisou ser revisto e até mesmo reinventado, buscando aproveitar o tempo para aprofundar a preparação das atividades, bem como pensar em novas formas de continuarem contato com o público enquanto perdurar o distanciamento social, e mesmo depois da pandemia, tendo em vista que algumas formas de atendimento presencial podem precisar sofrer mudanças. Nesse sentido, diversos museus estão considerando outras maneiras de dialogar com a sociedade no momento atual, incluindo um maior envolvimento virtual.
Em diversos lugares, trabalhadores que possuíam contratos temporários se viram fragilizados com a situação, correndo o risco de perderem seus empregos, mesmo com a orientação geral de que os empregadores busquem honrar os vínculos de trabalho com seus empregados.
Museus em todo o mundo tiveram que adiar ou cancelar exposições devido às restrições de visitação, bem como de deslocamento, ou dificuldades para o transporte de objetos museológicos. É provável que a situação também afete as decisões de empréstimos para exposições temporárias (Adams, 2020).
No que tange as coleções, algumas instituições já estão se debruçando na coleta contemporânea de registros para capturar a história da pandemia. Outras estão procurando tornar cada vez mais acessível as suas coleções por meio de sites na internet. Repositórios digitais também favorecem a difusão de acervos culturais digitalizados (Martins, 2020).
Diante da realidade atual torna-se de fundamental importância aprender com a experiência uns dos outros e construir colaborações mesmo que a distância.
Transformando a crise em oportunidade
O novo coronavírus está provando ser um catalisador para uma rápida mudança de comportamento em muitos aspectos. Temos podido testemunhar exemplos incríveis de empatia, engenhosidade, solidariedade e criatividade nessas primeiras semanas da pandemia (Sparks, 2020).
É importante permanecer aberto ao inesperado, pois ideias e soluções não-tradicionais podem fornecer estabilidade em momentos de estresse e incerteza. É preciso que os museus estejam aptos a se abrir a novos empreendimentos e parcerias (Drumm, 2020). E tomara que todas essas recentes habilidades e experiências adquiridas sejam transferidas para a sustentabilidade dos museus a longo prazo (Counts, 2020).
Através da inventividade dos trabalhadores com relação a maneiras originais de executar as tarefas, um dividendo de criatividade está começando a aparecer. Velhas formas de trabalhar estão sendo questionadas e as prioridades reavaliadas (Durant, 2020).
Como nunca visto antes, os museus possuem agora uma incrível oportunidade de reimaginar a sua missão, visão e impacto, buscando descobrir como podem responder às necessidades atuais da sociedade e ser mais relevantes para diversos públicos, bem como mais ágeis em responder a um mundo em rápida mudança (Decatur, 2020).
As pessoas, de forma geral, estão muito desejosas de se conectar umas com as outras. Esta oportunidade deve ser aproveitada ao máximo pelos museus, usando de todo o seu potencial criativo! E para o público infantil, buscar sempre uma linguagem divertida.
Existe uma enorme demanda por ação digital. Diversas instituições estão apostando nas mídias sociais (Instagram, Facebook, YouTube), preparando novos conteúdos para os seus sites institucionais, para a realização de exposições virtuais, visitas remotas aos espaços do museu e jogos interativos online, entre outras ações.
Pesquisas também têm sido priorizadas, tanto para o planejamento de exposições futuras, estudos de percepção sobre a pandemia, como também para a organização de novas atividades remotas para diferentes públicos. Reuniões virtuais para a troca e compartilhamento de experiências também têm acontecido, além de encontros via internet para manter a rede de afetos.
Existem muitas frentes que estão sendo abertas, inclusive com comunidades do entorno, buscando sempre ampliar a atuação do museu na sociedade. Por exemplo, o Galpão Bela Maré, do Observatório de Favelas, no Rio de Janeiro, tem colaborado na campanha de comunicação Como se proteger do coronavírus em favelas e periferias?, criada pelo Observatório de Favelas, voltada para moradores de comunidades, com dicas e orientações de cuidados em tempos de pandemia. Os principais desafios enfrentados por museus que possuem poucos recursos financeiros para realizar ações como essa, são o acesso precário à internet e a falta de equipamentos adequados (câmeras, computadores, microfones, smartphones, etc.) (CECA-BR e REM-BR, 2020).
A educadora Sarah Erdman chama a atenção para o fato de que - neste momento de inseguranças e incertezas - todos nós precisamos “nos concentrar em sobreviver”. E enfatiza que não só podemos sobreviver, como também podemos prosperar. “Nós podemos, porque o campo museal é formado por pessoas incrivelmente atenciosas e criativas, que pensam constantemente no seu papel social e em como o museu pode ser” (Erdman, 2020).
Nesse sentido, é fundamental olharmos para além das nossas fontes habituais. Este é o momento de ousar, de sermos inventivos, solidários, de nos abrirmos para os diálogos possíveis e, mais do que nunca, de imaginar uma nova atuação dos museus na sociedade, não só no momento presente, mas também no futuro pós-pandemia.
[1] Museu da Vida, COC/Fiocruz. Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
Referências
- ADAMS, G. K. (2020). “Coronavirus: how will it affect museums and what can be done”. Museums Association UK. 10/03/2020. Disponível em: https://www.museumsassociation.org/news/10032020-coronavirus-impact-museums-galleries
- CECA-BR e REM-BR (Organizadores). Documento “Resultados da Reunião Educativos Museais e Ações Digitais na Pandemia”. Comitê Brasileiro de Educação e Ação Cultural do ICOM e Rede de Educadores de Museus – Brasil. 17 de Abril de 2020.
- COUNTS, C. (2020) “We Are Truly Getting Through This Together”. Informal Learning Review. A Publication of Informal Learning Experiences. ILR Special Issue 2020.
- DECATUR, R. (2020). “Reimagining”. Informal Learning Review. A Publication of Informal Learning Experiences. ILR Special Issue 2020.
- DRUMM, M. (2020) “Hands-On, Hands-Off, or Something New”. Informal Learning Review. A Publication of Informal Learning Experiences. ILR Special Issue 2020.
- DURANT, G. (2020) “Questacon. Things can only get better”. Informal Learning Review. A Publication of Informal Learning Experiences. IRL Special Issue 2020.
- ERDMAN, S. (2020) “Surviving and Thriving as Museum Professionals”. Informal Learning Review. A Publication of Informal Learning Experiences. ILR Special Issue 2020.
- INFORMAL LEARNING REVIEW. A Publication of Informal Learning Experiences, Inc. ILR Special Issue 2020. ISSN 2642-7419. Disponível em: http://informallearning.com/assets/publicpdf/ILR-Special-Issue-2020.pdf?utm_source=CAISE+Communications&utm_campaign=597b36d2d6-EMAIL_CAMPAIGN_2020_MARCH_COPY_01&utm_medium=email&utm_term=0_784eb58902-597b36d2d6-95696529
- MARTINS, Dalton (2020). Webnário “O Repositório Digital Tainacan e a Difusão de Acervos Culturais”. Mediação: Luciana Conrado Martins. 08 de Maio de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=R-56HPuiOCQ&feature=youtu.be
- SPARKS, G. (2020) “Coronavirus and Connection to Each Other”. Informal Learning Review. A Publication of Informal Learning Experiences. ILR Special Issue 2020.
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