Cláudia Maria Alves Vilhena

É extremamente importante tratar na 16ª Semana de Museus um tema tão relevante quanto ao que está sendo proposto para este ano: Museus hiperconectados, novas abordagens, novos públicos. Sabe-se que as tecnologias estão sendo cada vez mais incorporadas. As mídias, os novos recursos de interação, as novas abordagens de conexão e de aproximação com os públicos apresentam-se como ferramentas inovadoras para atingir cada vez mais novos públicos e fazer com que estes conheçam e até mesmo visitem virtualmente ou fisicamente espaços museológicos tão diversos nos país.

Entretanto, quando se refere a museus hiperconectados, é necessário, antes de tudo, perguntar quem vai hiperconectar os museus? Obviamente que são pessoas, funcionários, seres humanos, que precisam conhecer e entender a história da instituição e dos objetos museológicos.

Essas instituições enquanto celeiros e representantes da memória coletiva, tem em cada objeto de coleção, informações históricas e técnicas, para dialogar tanto com seu público interno, tal qual com a sociedade, por fazerem parte da história. Neste sentido, a hiperconectividade como um fenômeno atual pode contribuir nesse processo de diálogo.

No entanto, ao falar de hiperconectividade, precisa-se tratar, em primeiro lugar, das relações interpessoais de funcionários nas instituições museológicas, pois, assim como a hiperconectividade, bem como o trabalho exercido pela equipe interna, ambos referem-se ao uso, organização, tratamento, recuperação e disseminação de informações. A informação e a mediação da informação estão presentes em todo o processo museológico exigindo, portanto, maior interação dos funcionários para o desenvolvimento do trabalho.

Como unidades de informação, o papel social dos museus enquanto local de ensino e de aprendizagem é, sobretudo, o de contribuir na formação do indivíduo. Assim, os museus estão sempre preocupados em aumentar o número de seu público visitante esquecendo-se, na maioria das vezes, que para obter tal mérito, necessitam preocupar-se, também com seu público interno, pois é a equipe de trabalhadores que tem a responsabilidade de preservar e de comunicar a herança cultural coletiva que se encontra sob a tutela das instituições museológicas no país e no mundo.

De acordo com o código de ética do ICOM para Museus (2001).

1.Os museus preservam, interpretam e promovem o patrimônio natural e cultural da humanidade.

Princípio: Os museus são responsáveis pelo patrimônio natural e cultural, material e imaterial. As autoridades de tutela e todos os responsáveis pela orientação estratégica e a supervisão dos museus têm como primeira obrigação proteger e promover este patrimônio, assim como prover os recursos humanos, materiais e financeiros necessários para este fim (CÓDIGO DE ÉTICA DO ICOM, 2001, p.131) [1].

Prover os recursos humanos significa, dentre outras motivar, treinar, capacitar, ouvir e valorizar o pessoal do museu, que, segundo Boylan (2011) [2], são a chave para a eficácia da instituição.

Então, para que isso aconteça, ainda de acordo com o Código de Ética [3] para o museu, a instituição deve promover oportunidades de forma adequada, de formação continuada e de desenvolvimento para seus profissionais a fim de manter sua eficiência. Isso se faz importante, pois “os funcionários do museu, quer sejam remunerados ou voluntários, são o recurso mais vital da instituição” (BOYLAN, 2011, p. 160) [4].

De acordo com o autor [5], apesar de toda a importância do acervo, sem a equipe responsável pela curadoria da exposição e pela conservação para disponibilizá-lo ao público, tal processo não seria possível. Em virtude disso, os funcionários precisam atuar em conjunto, compartilhando o conhecimento profissional por meio de trocas de informações salutares e relevantes ao processo museológico; acarretando, com isso, uma melhor tomada de decisão e consequentemente em resultados mais positivos para a instituição.

Figurelli (2013) [6], em seu artigo denominado O público interno dos museus: reflexões sobre os funcionários de museus enquanto público-alvo das ações educativas museológicas, afirma que o museu precisa perceber sua equipe interna de trabalhadores como público em potencial, salientando que as instituições museológicas precisam olhar para o seu pessoal interno com o intuito de reconhecer sua equipe, enquanto público e envolvê-la na realidade que permeia os museus. Pois, a missão maior da instituição é trabalhar para as pessoas e com as pessoas.

A autora denomina a equipe interna do museu como o “público esquecido” (FIGURELLI, 2013, p. 34) [7] e propõe uma ação educativa, voltada para essa equipe. Esta ação tem como intuito demonstrar para o corpo de trabalhadores sua importância, enquanto indivíduos que lidam diariamente com a herança patrimonial coletiva.

Nesse sentido, o público interno do museu é também, um público estratégico para a instituição, pois são eles que trabalham para garantir a melhor imagem do museu junto ao público visitante. Assim, todos devem estar alinhados estrategicamente e em comunicação constante com todos os outros departamentos e com a direção do museu.

Com o crescimento das instituições museológicas no país e sua importância como lugar de fruição e de diálogo, obrigam-nas que estejam preparadas para lidarem com o mercado e com uma sociedade cada vez mais exigente. Ante tamanha exigência, os museus necessitam capacitar seus profissionais a fim de atender as novas demandas. Pois, assim como ocorre em outras organizações, o que os museus buscam, são pessoas comprometidas para trabalhar em seus espaços. E o que os profissionais, assim como os profissionais de museus aspiram, são a valorização e o reconhecimento do trabalho.

Para isso, torna-se necessário criar em seus espaços uma estrutura organizacional, um ambiente de aprendizagem coletiva voltado para a troca de informações, compartilhamento do conhecimento e motivação de toda a equipe de trabalhadores internos, pois nas palavras de Santos (1999, p. 67), “não há espaço para a contribuição do grupo, troca, enriquecimento mútuo, crítica salutar, porque nossa pobreza política não nos permite ver além de nossos próprios interesses e de nosso próprio umbigo”. É o que ocorre em algumas instituições, não há o envolvimento da equipe, além disso não existe uma cultura para o compartilhamento do conhecimento individual, quer seja por falta de motivação dos servidores ou por falta de um espaço aberto ao diálogo.

Alves (2004) afirma que os gerentes de unidades de informação necessitam de pessoas cada vez mais preparadas para atender as novas demandas de serviços que elas proporcionam, reafirmando uma administração participativa. Sob essa perspectiva, Silva (2011) [8] aponta que os museus, enquanto espaço cultural, abundante de conhecimento e de saberes, a serviço da comunidade, devem ser também utilizados como instrumento para o ensino de seu público interno de trabalhadores. A autora usa como exemplo em seu artigo: Educar desde dentro: ações educativas em museus para seus trabalhadores, o programa Consciência Funcional, desenvolvido pela Pinacoteca do Estado de São Paulo por meio de ações educativas realizadas internamente com seus funcionários, cuja finalidade “é estabelecer um diálogo constante com os funcionários dos diversos núcleos do museu, ampliando sua percepção dos diferentes trabalhos desenvolvidos dentro da instituição e sobre a natureza da própria instituição” (SILVA, 2011, p. 6) [9].

Em suma, hiperconectar museus, trabalhar e mediar a informação, bem como fazer uso dos recursos informacionais e gerenciar o público interno de museus são processos que estão totalmente imbricados. O que denota o quanto é necessário aprofundar sobre esses temas, a fim de manter a verdadeira essência das instituições museológicas, quais sejam, preservação e comunicação do patrimônio cultural junto à sociedade.


[1] CÓDIGO DE ÉTICA DO ICOM PARA MUSEUS. In:____. Legislação sobre museus. 2. Ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2013, p. 129-149.

[2]BOYLAN, P. J. Gestão de pessoal. In: ICOM – Conselho Internacional de Museus. Como gerir um museu. Manual prático. Brodowski: Associação Cultural de Apoio ao Museu Casa de Portinari; São Paulo: Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, 2004. p. 160-174.

[3] CÓDIGO DE ÉTICA DO ICOM PARA MUSEUS, op. cit.

[4] BOYLAN, P. J, op. cit. p. 160.

[5] Ibidem, 2004.

[6] FIGURELLI, R. G. O público interno dos museus: reflexões sobre os funcionários de museus enquanto público-alvo das ações educativas museológicas. Cadernos de Sociomuseologia, Lisboa, v. 46, n.2, 2013.

[7] Ibidem, p. 34.

[8] SILVA, M. STELLA da. Educar desde dentro: ações educativas em museus para seus trabalhadores. In: Encontro Internacional Diálogos em Educação, Museu e Arte. São Paulo, 2011.

[9] Ibidem, p. 6.

Referências

  • ALVES, R. C. V. A gestão de pessoas em unidades de informação: a importância da capacitação no uso de tecnologias. Revista de iniciação científica da FFC. 2004. Unesp. São Paulo, p. 32-50. Disponível em:< http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/ric/article/view/79/81>. Acesso em 01/05/2018.
  • BOYLAN, P. J. Gestão de pessoal. In: ICOM – Conselho Internacional de Museus. Como gerir um museu. Manual prático. Brodowski: Associação Cultural de Apoio ao Museu Casa de Portinari; São Paulo: Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, 2004. p. 160-174. 
  • CÓDIGO DE ÉTICA DO ICOM PARA MUSEUS. In:____. Legislação sobre museus. 2. Ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2013, p. 129-149. 
  • FIGURELLI, R. G. O público interno dos museus: reflexões sobre os funcionários de museus enquanto público-alvo das ações educativas museológicas. Cadernos de Sociomuseologia, Lisboa, v. 46, n.2, 2013. Disponível em: <file:///C:/Users/Cl%C3%A1udia/Downloads/4521-1-14942-1-10-20140624%20(2).pdf>. Acesso em 01/05/2018. 
  • IBRAM – Instituto Brasileiro de Museus. Disponível em: <http://www.museus.gov.br/acessoainformacao/o-ibram/>. Acesso em: 26/04/ 2018. 
  • SANTOS, Maria Célia T. Moura. Processo Museológico: critérios de exclusão. In: SEMANA DOS MUSEUS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. 2., 1999. Anais... São Paulo, 1999. p.65-72. 
  • SILVA, M. STELLA da. Educar desde dentro: ações educativas em museus para seus trabalhadores. In: Encontro Internacional Diálogos em Educação, Museu e Arte. São Paulo, 2011. Disponível em: <http://museu.pinacoteca.org.br/wp-content/uploads/sites/2/2017/01/gad_MARIA-STELLA-DA-SILVA.pdf>. Acesso em: 01/05/2018.

 

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