Jorge Leal da Silva [i]
De acordo com dados da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior do Brasil (Andifes), o orçamento de 55 milhões de reais que seria utilizado na reconstrução do Museu Nacional, administrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sofreu corte de R$ 12 milhões, cerca de 21,63% por parte do Poder Executivo.
Tomando como base essa constatação, a preocupação deste artigo é trazer adequado grau de teorização à situação, para que se possa compreender o ocorrido. Deste modo, afirmo que antes de compreender o empírico, nada mais salutar do que compreender aspectos teóricos. Nesse exercício, recorro ao Mark Granovetter que em seu artigo “Threshold Models of Colective Behavior” estabelece o comportamento governamental frente às situações como a prioridade a determinados problemas públicos.
No artigo supracitado, discute-se o desenvolvimento dos modelos de comportamento coletivo em situações onde os atores têm duas alternativas a serem tomadas e os custos e/ou benefícios de cada uma dependerá de quantos outros atores vão escolher determinadas alternativas. Essas ações decisões são consideradas como ações estratégicas de manutenção de poder e examinadas sob a lógica comportamentalista.
Nesse limiar, a discussão do conceito-chave “threshold” se faz fundamental nos argumentos tecidos pelo autor durante a construção do artigo. Se traduzido para o português, o termo corresponde ao ponto “limite” com que essas decisões deveriam ser tomadas antes mesmo de determinados atores tomarem – justamente para ser considerado com base para futuras decisões estratégicas. Sendo assim, o autor traz modelos que tratam as decisões como sendo binárias ao passo que um ator tem duas alternativas comportamentais distintas e mutuamente exclusivas.
Como metodologia de pesquisa, faz uso não só de explicações teóricas como também de técnicas quantitativas de pesquisa, de modo que as discussões são colocadas de forma matematizada para confluir com a questão de pesquisa que é a de encontrar um equilíbrio em um processo que ocorre ao longo do tempo. Para tanto, começa com uma distribuição dos limiares de frequência, indicando que os modelos permitem o cálculo do número final ou "equilíbrio, considerando que a estabilidade dos resultados de equilíbrio contra várias mudanças possíveis nas distribuições precisa ser considerada.
Nesse curso alerta e informa o leitor que pelo fato dos grupos com preferências médias similares gerarem resultados (decisões) decorrentes de preferências muito diferentes, é perigoso inferir disposições individuais a partir de resultados de agregação ou para assumir que o comportamento foi dirigido por última análise acordados normas.
Nesse sentido, a intenção é discutir a aplicação do modelo formal com vistas a se encontrar não só aspectos comportamentais da ação e decisão dos atores envolvidos em diversas situações, como também evidenciar um possível equilíbrio ao longo do tempo nas relações sociais examinadas.
Em relação ao conteúdo do artigo, o autor entende que a decisão pode ser pensada como tendo um lado positivo e negativo de decidir fazer uma coisa ou não, como na decisão de participar de um motim ou grupo. Com efeito, as diferenças, o incomum e as heterogeneidades dos indivíduos são foco principal dos modelos. No entanto, o autor delimita a análise do artigo, ao modelo formal.
Por essa razão, logo nos primeiros parágrafos, o autor sugere possíveis aplicações do modelo formal para estudar situações de difusão de inovações, rumores e doenças, greves, a votação, o nível de instrução, ocasiões sociais, a migração e psicologia social experimental. Na sequência, ao tratar do equilíbrio nas decisões, o autor apresenta como objetivo principal do modelo formal a ação de prever, a partir da distribuição inicial de limiares, o número final ou proporção fazendo cada uma das duas decisões. Nesse ponto, faz uso de exemplos que auxiliam a compreensão do raciocínio seguido.
Um desses exemplos didaticamente utilizados, foi que para explicar o que seria esse limite, o autor sublinha que este pode ser operado de modo contínuo sem que haja substanciais alterações. O autor usa o exemplo da conversão religiosa onde os indivíduos se comportam de certa forma, de acordo com padrões professados e que, portanto, esses comportamentos presentes e futuros seriam previamente conhecidos, uma vez que podem ser previstos se dificilmente alterados ao longo do tempo. Por outro lado, o autor contrapõe dizendo que pode haver também a possibilidade de comportamentos serem alterados em função da situação, conforma se administra a relação de custos e benefícios da ação humana.
Nesse contínuo, Granovetter reconhece que modelos “threshold” podem ser de particular valor para se compreender situações em que o nível médio de preferências corre claramente em favor de alguma ação, mas esta não é tomada. Em termos de razão de existir dos modelos, isso significa então que um objetivo final e necessário de concepção de modelos de “threshold” é o de que ao desenvolver procedimentos matemáticos para avaliar as características de estabilidade de equilíbrio de qualquer distribuição, é possível se conhecer certa variedade de possíveis perturbações do processo, e por fim, empregar análises interpretativas mais sensatas, ao invés de inferir possíveis comportamentos de atores com base em probabilidades frouxas.
Nessa esteira, procurando trazer robustez para o modelo em discussão, o autor discute dois fatores específicos que podem desempenhar um papel importante na mudança dos efeitos de distribuições do modelo “threshold”, quais sejam: estrutura social e a dispersão espacial / temporal da ação social. Por estrutura social, o autor a trata como a influência que uma determinada pessoa tem sobre o comportamento de alguém e como isso pode depender da relação ora estabelecida. Na visão dele, a riqueza deste tipo de analise consiste no especificar o impacto da estrutura social nos resultados coletivos.
Outro ponto examinado pelo autor se refere ao aspecto normativo propulsor de comportamentos. Quanto a isso, considera-se que as normas não são irrelevantes, mas exercem influência causal sobre o comportamento das pessoas e mesmo que nem sempre sejam decisivas. Por consequência, tem-se o conceito de “threshold”, então, como puramente comportamental que em nada tangencia pensamentos dos indivíduos sobre quais coisas "certas" deverão ser feitas.
Por essa razão, fundamenta e explica o porque dos modelos thresholds ao levarem em consideração elementos de comportamento coletivo, colocam como elementos de análise centrais na teoria dos jogos a heterogeneidade substancial de preferências e a interdependência de decisões ao longo do tempo.
No final, ao ter apresentado modelos de comportamento coletivo, com base em limites comportamentais, que correspondem a resultados coletivos por princípios simples de agregação. Os modelos são particularmente valiosos em ajudar a compreender situações onde os resultados não parecem intuitivamente consistente com as preferências individuais subjacentes.
Tais modelos podem ser úteis nas configurações de pequenos grupos, bem como aqueles com um grande número de agentes. Sua maior contribuição encontra-se na possibilidade de análise de situações onde muitos atores se comportam de maneiras dependentes um do outro, onde há poucos precedentes institucionalizados e pouca estrutura preexistente.
Em termos de estruturação das ideias, o artigo apresenta não só robusta organização e profundidade das discussões, como também faz uso de diversos exemplos que auxiliam o leitor na compreensão geral da temática sobre o comportamento em momentos de decisão individual e/ou coletiva. É sob esses termos que aponto os pontos fortes mais visíveis do artigo. Por outro lado, o uso excessivo de notas de rodapé e até mesmo de exemplos, constituem pontos fracos a se destacar que poderiam ter sido utilizados com maior parcimônia.
Embora as discussões tecidas pelo autor carreguem demasiada influência da sociologia e ciência política, suas contribuições não se restringem única e exclusivamente a essas áreas, tampouco se confundem com a literatura do campo de públicas. Por essa razão, considera-se que a discussão levantada no artigo apresenta congruência explicativa para o porque do Governo Federal ter priorizado outras áreas que não a reconstrução do Museu Nacional.
[i] Administrador pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).Mestrando em Administração com ênfase em organizações do setor público pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Atua na linha de pesquisa Gestão de Organizações Públicas, Governança e Sociedade. Membro-Pesquisador do Grupo de Pesquisa Direito e Políticas na América Latina (DIPAL). E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.
Referências
- Mark Granovetter& Roland Soong (1983) Thresholdmodels of diffusion and collective behavior, The Journal of Mathematical Sociology, 9:3, 165-179, DOI: 10.1080/0022250X.1983.9989941