Juliana Muniz [a]
O famoso Centro do Rio de Janeiro tem como símbolos atrativos suas construções centenárias e seu viés histórico. Um olhar atento nas edificações ali presentes permite resgatar parte da valiosa história da nossa cidade.
E dentre tantos monumentos históricos, existe o “Arco do Teles”, localizado na Praça XV, que tanto é um patrimônio cultural tombado pelo IPHAN como, também, um espaço de entretenimento, diversão, cultura e turismo, por conta dos inúmeros restaurantes, bares e diversões noturnas ali presentes.
Porém, para espanto de todos, hoje, estabelecimentos de empresários e comerciantes que possuem atividade nas redondezas do “Arco do Teles”, estão virando alvo de ações criminosas. Imóveis históricos estão sofrendo com arrombamentos, atos de vandalismo e depredações decorrentes do fechamento daqueles estabelecimentos, e do abandono geral da área em razão do risco de contágio e disseminação do novo coronavírus.
Diversos imóveis localizados nas redondezas do “Arco do Teles” são tombados pelo patrimônio nacional, sendo sua conservação, salvaguarda e monitoramento pertencente ao IPHAN. Entretanto, mesmo esta proteção legislativa não foi capaz de impedir o verdadeiro atentado contra a cultura nacional que ali ocorreu.
Comerciantes da região relatam que indivíduos invadem os imóveis, os depredam vendem itens furtados/roubados por eles. Dentre os objetos subtraídos encontram-se madeiras, grades, portas, etc. Diariamente são retirados materiais, que são oferecidos por qualquer preço, pois saem de graça para os indivíduos que cometem esses delitos. [1]
E esta situação de calamidade é agravada ainda mais por um movimento uníssono dentro dos setores públicos para suspender o cumprimento de mandados de reintegração de imóveis durante a pandemia. Nesse sentido, vem surgindo inúmeras decisões judiciais que suspendem as ações possessórias sob a alegação principal de que a retirada destas pessoas dos espaços invadidos tornaria ainda mais difícil o trabalho de isolamento desta população e, consequentemente, da Covid-19.
Existem ainda outras alegações com mesmo objetivo, como, por exemplo, a do Tribunal de Justiça de São Paulo, que acabou por declarar que as reintegrações de posse colocariam em risco a saúde de diversos profissionais envolvidos no cumprimento da ordem, e inclusive dos próprios ocupantes. [2]
Já no âmbito legislativo tramitam Projetos de Lei que visam suspender os cumprimentos dos mandados de reintegração e despejo, como forma de resguardar invasores de imóveis e inquilinos que estejam passando por um contratempo financeiro. Os Projetos de Lei Federal 1.975/2020 e 1.112/2020 suspendem o cumprimento de mandados de despejo de imóveis residenciais e mandados de reintegração de posse por débitos, pelo período que durar as medidas de isolamento para conter a pandemia de Covid-19. Vem tramitando também na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) projeto de lei 2022/2020 que dispõe no mesmo sentido. [3]
Esse recente movimento das instituições públicas vem prejudicando a indústria do turismo na região do “Arco do Teles” pois vem facilitando o trabalho dos invasores e depredadores. O patrimônio histórico situado naquela área vem sendo destruído na medida em que tais deliberações legislativas e judiciais atingem a cultura nacional permanentemente, bem como os empresários após o retorno da atividade econômica, a curto, médio e longo prazo.
Além disso, tais medidas causam insegurança jurídica ao empresário que, diante do atual entendimento do judiciário e do legislativo, assiste à depredação sem poder contar com o auxílio dos poderes públicos para garantir o direito à propriedade privada. O descaso das autoridades públicas está poderá acarretar um possível fim dessas atividades que geram renda, emprego e movimentam a economia, além de prejudicar as riquezas históricas da cidade que estão retratadas nessas construções tombadas no “Arco do Teles”.
Em que pese o IPHAN ter o dever de proteção dos bens culturais do País, é importante destacar que, não se pode buscar somente na esfera federal a solução para essa catástrofe cultural que atinge também a propriedade privada. O art. 23 da Constituição Federal atribui tanto a União quanto aos Estados e Municípios o dever de proteger bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos.
Nos casos de depredação de imóveis tombados, além de constituir crime contra o patrimônio privado, configura também crime contra o patrimônio cultural nos termos do art. 165 do Código Penal. Eventuais inquilinos que estejam passando por dificuldade financeira por conta da pandemia do novo coronavírus devem ser protegidos pela legislação, mas não aqueles que nunca tiveram teto e utilizam da lei para a prática de atos criminosos e possuem finalidade diversa da moradia.
Por fim, fica clara a necessidade proteger a propriedade privada, o turismo, a cultura e o patrimônio histórico da atual crise da COVID 19. Os estabelecimentos comerciais instalados no “Arco do Teles”, realizam de atividade produtiva, geram renda e emprego. Além disso, os empresários e proprietários instalados naquele local tem sua parcela de responsabilidade na integralidade, boa aparência e manutenção do patrimônio tombado, portanto, possuem o direito de também serem protegidos pela legislação pátria. As crises são cíclicas e momentos de instabilidade financeiras e de saúde ocorreram de tempos em tempos ao longo de nossa história. Sendo assim, fica evidente a necessidade de impedir que a crise passageira acabe com a indústria do turismo naquela área.
[i] advogada do MLA – Miranda Lima Advogados.
[1] https://biblioo.cartacapital.com.br/quarentena-agrava-situacao-do-patrimonio-historico-diz-diretor-do-inepac/
https://diariodorio.com/onda-de-invasoes-agora-causa-depredacao-de-conjunto-historico-tombado/
https://diariodorio.com/alerj-aprova-suspensao-de-despejos-mas-acaba-legalizando-invasoes/
[2] https://www.conjur.com.br/2020-abr-29/tj-sp-suspende-reintegracao-posse-epidemia-covid-19
[3] http://www.alerj.rj.gov.br/Visualizar/Noticia/48513
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2249882
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2242176